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Médica e Saúde

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Os documentos médicos e a Resolução 2.381/24 do CFM.

  • Foto do escritor: Ricardo Romano
    Ricardo Romano
  • 30 de ago.
  • 6 min de leitura

Médico, de estetoscópio, segurando documentos médicos
Médico, de estetoscópios, segurando documentos médicos.

  1. Introdução;


A emissão de documentos médicos sempre foi um pilar fundamental da prática médica, servindo não apenas como registro do ato médico realizado, mas também como instrumento de garantia de direitos tanto para pacientes quanto para profissionais.


Em julho de 2024, o Conselho Federal de Medicina (CFM) promoveu uma significativa atualização normativa ao publicar a Resolução nº 2.381/24, revogando a antiga Resolução 1.658/2002 e estabelecendo novos parâmetros para a emissão de documentos médicos em todo o território nacional.


Esta mudança, que veio após mais de duas décadas de vigência da norma anterior, não representa apenas uma simples atualização burocrática. Trata-se de uma resposta necessária às transformações tecnológicas, sociais e jurídicas que ocorreram nesse período, incluindo o advento da telemedicina, a implementação da Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD) e o combate crescente às fraudes documentais que proliferaram, especialmente com o surgimento de plataformas digitais de venda irregular de atestados médicos.


  1. A Presunção de Veracidade e o Valor Jurídico dos Documentos Médicos;


Um aspecto fundamental reafirmado pela nova resolução é que os documentos médicos gozam de presunção de veracidade, produzindo plenos efeitos legais para os quais se destinam. Isso significa que, até prova em contrário, o conteúdo de um documento médico é considerado verdadeiro perante autoridades administrativas, judiciais e empregadores.


Essa presunção não é mero privilégio profissional, mas reflexo da fé pública depositada no exercício da medicina e da responsabilidade ética e legal que recai sobre os profissionais.


A resolução enfatiza que os médicos devem estar atentos às repercussões e responsabilidades no âmbito civil, penal e administrativo ao elaborarem qualquer documento médico. Isso porque a emissão irregular ou fraudulenta de documentos pode configurar crimes previstos no Código Penal, além de infrações éticas passíveis de sanções pelos Conselhos de Medicina, que podem variar desde advertências até a cassação do registro profissional.


  1. Os Requisitos Mínimos Obrigatórios: Padronização e Segurança;


Uma das principais inovações da Resolução 2.381/24 foi estabelecer requisitos mínimos obrigatórios que devem constar em todos os documentos médicos, independentemente de sua natureza ou finalidade. Essa padronização visa garantir maior segurança jurídica e facilitar a verificação da autenticidade dos documentos.


Segundo a norma, todo documento médico deve conter: identificação completa do médico (nome e CRM/UF), Registro de Qualificação de Especialista (RQE) quando houver, identificação do paciente (nome e CPF), data de emissão, assinatura qualificada do médico quando em formato eletrônico ou assinatura e carimbo quando manuscrito, dados de contato profissional (telefone e/ou e-mail) e endereço profissional ou residencial do médico.


Essa exigência de informações completas não é mera formalidade. Ela permite rastrear a origem do documento, verificar a habilitação do profissional emissor e estabelecer um canal de comunicação para eventuais esclarecimentos ou confirmações.


A inclusão obrigatória do CPF do paciente, por exemplo, dificulta fraudes e uso indevido de documentos por terceiros.


  1. A Exigência de Identificação com Foto: Combate às Fraudes;


Uma mudança significativa e polêmica introduzida pela nova resolução é a obrigatoriedade de identificação dos interessados na obtenção de documento médico através da conferência de documento de identidade oficial com foto. Essa medida, que se aplica tanto ao examinado quanto ao seu representante legal, representa uma resposta direta ao crescimento exponencial de fraudes envolvendo atestados médicos falsificados ou obtidos irregularmente.


A exigência pode parecer burocrática para alguns, mas reflete a necessidade de proteger tanto os médicos quanto os pacientes legítimos. Para os profissionais, representa uma salvaguarda contra eventuais alegações de emissão irregular de documentos. Para os pacientes, garante que seus dados e direitos não sejam usurpados por terceiros mal-intencionados.


  1. A Tipologia dos Documentos Médicos: Clareza nas Definições;


A Resolução 2.381/24 trouxe uma contribuição fundamental ao estabelecer definições claras para treze tipos diferentes de documentos médicos, além de uma categoria genérica para documentos não especificados. Essa categorização não é meramente didática; ela estabelece limites claros sobre o conteúdo, a finalidade e até mesmo a possibilidade de cobrança de honorários para cada tipo de documento.


Entre os documentos regulamentados estão o atestado médico de afastamento, que deve especificar a quantidade de dias necessários para recuperação; o atestado de acompanhamento, que confirma a presença de acompanhante em consulta ou procedimento; a declaração de comparecimento, que pode ser fornecida inclusive pelo setor administrativo; e o atestado de saúde, com suas múltiplas aplicações.


Particularmente importante é a distinção estabelecida entre o relatório médico circunstanciado, que não importa em majoração de honorários quando o paciente está em acompanhamento regular há menos de seis meses, e o relatório médico especializado, que por sua complexidade e necessidade de pesquisa e fundamentação científica, permite a cobrança de honorários adicionais em serviços privados.


  1. A Questão do Diagnóstico nos Atestados: Proteção da Privacidade;


A resolução mantém e reforça as regras sobre a inclusão de diagnóstico nos atestados médicos, estabelecendo que isso só pode ocorrer por justa causa, em exercício de dever legal ou por solicitação expressa do próprio paciente ou seu representante legal. Quando a solicitação partir do paciente, essa concordância deve estar expressa no atestado e registrada em prontuário.


Essa proteção é fundamental considerando que informações sobre saúde são dados pessoais sensíveis nos termos da LGPD. A revelação não autorizada de diagnósticos pode causar discriminação no ambiente de trabalho, constrangimentos sociais e violação da intimidade do paciente. A norma equilibra o direito à privacidade com as necessidades legítimas de comprovação de condições de saúde para fins específicos.


  1. O Combate à Comercialização Irregular de Atestados;


Um dos principais motivadores para a atualização normativa foi o crescimento alarmante de plataformas digitais que comercializavam atestados médicos de forma irregular. A nova resolução, ao estabelecer requisitos mais rígidos de identificação e padronização, dificulta significativamente essas práticas fraudulentas.


Além disso, a norma reforça o dever do médico de denunciar ao Conselho Regional de Medicina qualquer indício de falsidade em atestados que detectar. Essa obrigação transforma cada profissional em guardião da integridade do sistema, criando uma rede de vigilância contra fraudes documentais.


  1. Impactos na Medicina do Trabalho;


Para os médicos do trabalho, a resolução traz orientações específicas sobre o Atestado de Saúde Ocupacional (ASO), reafirmando sua conformidade com a Norma Regulamentadora 7 e o Programa de Controle Médico de Saúde Ocupacional. A padronização dos requisitos documentais facilita a integração entre os sistemas de saúde ocupacional e os demais serviços médicos, garantindo maior continuidade no cuidado ao trabalhador.


A norma também esclarece a questão dos atestados para acompanhantes, estabelecendo que o médico pode confirmar a presença do acompanhante e a necessidade de cuidados do paciente, mas não pode indicar especificamente quem deve ser esse acompanhante, respeitando assim os limites legais trabalhistas.


  1. Desafios e Perspectivas para o Futuro;


A implementação da Resolução 2.381/24 representa um avanço significativo na regulamentação dos documentos médicos, mas também traz desafios. Os profissionais precisam se adaptar aos novos requisitos, o que pode demandar ajustes em sistemas eletrônicos, treinamento de equipes e mudanças em rotinas estabelecidas.


Por outro lado, a maior padronização e segurança dos documentos médicos beneficia toda a sociedade. Empregadores terão maior confiança na veracidade dos atestados apresentados, reduzindo conflitos trabalhistas. O sistema de saúde como um todo ganha em credibilidade e eficiência. E os pacientes têm seus direitos melhor protegidos, com documentos mais completos e seguros.


  1. Conclusão;


A Resolução CFM nº 2.381/24 representa muito mais do que uma simples atualização normativa. Ela reflete a evolução da medicina em um mundo digitalizado, onde a segurança da informação e a proteção de dados sensíveis tornaram-se imperativos éticos e legais. Ao estabelecer padrões claros e requisitos rigorosos para a emissão de documentos médicos, o CFM reafirma o compromisso da classe médica com a verdade, a ética e o bem-estar social.


Para os médicos, a nova resolução deve ser vista não como um conjunto de burocracias adicionais, mas como um instrumento de proteção profissional e valorização do ato médico.


Para a sociedade, representa a garantia de que os documentos médicos continuarão sendo instrumentos confiáveis de comprovação de condições de saúde e exercício de direitos.


A adequação às novas normas é não apenas uma obrigação legal, mas uma oportunidade de reafirmar os valores fundamentais da medicina: a confiança, a responsabilidade e o compromisso inabalável com a verdade e o cuidado humano. Em tempos de desinformação e fraudes digitais, a Resolução 2.381/24 surge como um farol de integridade, guiando a prática médica por caminhos mais seguros e transparentes.


Fonte: Resolução CFM nº 2.381, de 20 de junho de 2024, publicada no Diário Oficial da União em 02 de julho de 2024. Link para acesso à íntegra da Resolução: https://sistemas.cfm.org.br/normas/arquivos/resolucoes/BR/2024/2381_2024.pdf

 
 
 

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